quarta-feira, 16 de maio de 2007

Para mais tarde recordar: Uma Vida Cheia


A Marta levou algumas peças, ferramentas, para o museu.

Eles gostaram e pediram alguns dados sobre o avô:


Nome: José Manuel
Data de Nascimento: 21-11-1908 (F.17-03-2007)
Local de nascimento: Sítio do Semedeiro
Local de onde vieram as peças: Passadeiras
Freguesia: São Bartolomeu de Messines
Concelho: Silves


Principal actividade, Agricultor: Cerca de 10 hectares entre regadio e sequeiro. Chegou a produzir cerca de 650 arrobas de milho de regadio, por ano (cerca de 10.000 kg). Fazia, sobretudo, agricultura de subsistência: Trigo, batatas, cebolas, alhos, feijão, grão-de-bico, azeite, vinho, cevada, aveia, centeio, tomate, melancia e melão, hortaliças, alfarroba, amendoim, forragens para criação de animais, laranjeiras, sobreiros e eucaliptos. Criava vacas, porcos, burros, mulas, galinhas, coelhos, patos, cães, pombos, etc.
Era um enxertador habilidoso: Raro era o enxerto que não pegava. Tinha formas de enxertar, de anilha, por exemplo, que não veêm nos compêndios da universidade. De cabeça, fazia as contas primeiro que os outros com papel e lápis.
Gostava de caçar a lebre, o coelho, a perdiz, a rola, o melro, etc., com espingarda e esparrela, laço, rede, ratoeira feitos por ele.
Às vezes ia à pesca à Ribeira (de Arade) com covo (que ele próprio fazia), anzol, rede ou tresmalho, e pescava o robalo, a enguia, o achigã e a carpa.
No ano que a Barragem (do Funcho) encheu fez uma jangada com quatro bidões.

Trabalhava a madeira desde a serração à carpintaria: Fez o próprio banco de carpinteiro, portas, janelas, carros de bestas, carros de mão, mesas, cadeiras, armários, camas e ferramentas diversas.
Gostava de trabalhar com metais, sobretudo a fazer ferramentas.

Trabalhava como pedreiro: Ajudou o seu pai a fazer, em taipa, a casa onde com ele viveu e depois, quando casou, fez, igualmente em taipa, a sua própria casa: com sala de entrada, sala de estar, quatro quartos, cozinha, casa de banho e os anexos: celeiro, alpendre, palheiro e currais dos animais, desde os alicerces até ao telhado. Fez o forno do pão. Fez a eira e o poço e empedrou-os. Fez a mina em frente de casa. Fez o poço da várzea, com mina, empedrou-o e fez a casa para o motor e a casa da várzea. Fez a canalização subterrânea na várzea e os tanques para lavar a roupa. Tinha uma pequena barragem na encosta para as águas sanitárias de casa.
Chegou a ir vender aguardente de medronho, com uma besta, ao Alentejo, onde foi vários anos à ceifa. Já depois dos 70 anos, quando deixou de ter animais de carga, tirou a carta de motorizada e conduzia um triciclo a motor que os filhos lhe ofereceram. Com 80 e tal, quando foram viver para Messines, ainda fez sozinho o furo, no quintal, cuja água fresca ele preferia, o forno do pão, e a casita da oficina onde ele passava horas a fazer miniaturas de alfaias agrícolas e a esculpir a cortiça. Também era frequente encontrá-lo a ler os seus livros de meditação e de orações que ele relia desde a juventude. Na Missa do Domingo era fácil encontrá-lo na Igreja, bastava procurar a cabeça mais branquinha.
Foi emigrante, pouco tempo, em França.
Foi casado com a Ti'Piedade com quem festejou os 67 anos de casados. Tiveram cinco filhos, dois rapazes e três raparigas, para além de dois gémeos que não sobreviveram.
Sobreviveu dezoito meses à viuvez. Nesse tempo, em Faro, ainda fez um banco de carpinteiro, uma cadeira com assento tecido em cordel, uma mesa para o grelhador forrada a inox, várias ferramentas e ajudou a fazer a casota do cão. Aprendeu a utilizar o telemóvel.
Este ano ia fazer 99.
Amanhã faz dois meses...

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